Cesar Augusto Cavazzola Junior
Nietzsche disse que Deus estava morto. Darwin catalogou os homens como parte do reino animal. Marx se apoiou nessas teorias. E os bons livros de história não nos deixam mentir sobre os efeitos do marxismo sobre a história da humanidade. A leitura da obra “O livro negro do comunismo”, no qual um grupo de historiadores e universitários encarou um empreendimento – em cada um dos continentes e dos países envolvidos – de fazer o balanço mais completo possível dos crimes perpetuados em nome do Comunismo a partir da abertura de inúmeros arquivos até então secretos, de testemunhos e contatos, catalogando locais, datas, fatos, vítimas e algozes. Partiram da matriz comunista da URSS de Lênin e Stalin, passando pela China e outros países pequenos, tudo a fim de responder porque o comunismo moderno surgido em 1917 se transformou numa ditadura sangrenta e depois num regime criminoso, o que era contrário aos seus primeiros princípios. Depois da realização desse trabalho hercúleo, chegou-se a um balanço considerado uma aproximação mínima que de acordo com as estimativas, a partir dos subsídios mencionados, permite concluir que a tentativa de instauração do regime comunista resultou em: 20 milhões de mortos na URSS, 65 milhões de mortos na China, 1 milhão de mortos no Vietnã, 2 milhões de mortos na Coréia do Norte, 2 milhões de mortos no Camboja, 1 milhão de mortos no Leste Europeu, 150.000 mortos na América Latina, 1,7 milhões de mortos na África, 1 milhão de mortos no Afeganistão, 10 milhões de mortos pelo movimento comunista internacional e partidos comunistas fora do poder, totalizando 100 milhões de mortos.[1] Steven Pinker reforça seu argumento ao afirmar que:
O uso próprio da biologia pelos nazistas é um lembrete de que ideias pervertidas podem ter consequências medonhas e que os intelectuais têm a responsabilidade de cuidar sensatamente para que suas ideias não sejam manipuladas para fins perversos.[2]
No mesmo sentido:
TRAGÉDIAS, GENOCÍDIOS, MASSACRES. O homem, em sua breve história, tem sido capaz das mais terríveis atrocidades, deixando em sua história um rastro indelével de maldade e sofrimento. Mas de onde vem esse comportamento? O que permite a vazão do mal por dentro dos grupos humanos e das sociedades a ponto de fomentar as mais nefastas manifestações de maldade, que o homem comum tem sequer a capacidade de compreender?
Os cientistas sociais têm tentado responder a essas perguntas enquanto observam perplexos as manifestações do mal sobre a Terra. Diante de seus olhos, especialmente nos últimos cem anos, regimes cada vez mais assassinos têm se descortinado, numa sequência nefasta de psicopatas detentores de muito poder: Hitler, Stálin, Mao, Pol Pot, Castro. Homens que mataram mais do que as pragas, doenças, guerras e cataclismos do passado.[3]
Na obra de Alain Supiot encontra-se elementos que também fortalecem os problemas ligados ao mau uso dos trabalhos e ideias científicas, para o qual:
Sob o império do cientificismo, o próprio ocidente veio a acreditar que a única realidade do Homem era de natureza biológica, e que a personalidade jurídica era, portanto, uma pura técnica de que se podia dispor à vontade. Mas os horrores do nazismo acabam de mostrar que essa redução do Homem ao seu ser biológico redundava em fazer da sociedade um mundo darwiniano submetido apenas à lei do mais forte.[4]
Um excelente trabalho sobre a manifestação da maldade humana e sua influência sobre os demais indivíduos pode ser encontrado na obra recentemente publicada no Brasil do médico polonês Andrew Lobaczewski. Trabalho escrito três vezes, pois as outras duas haviam sido destruídas. Trata-se de um estudo de valor inestimável sobre a manifestação do mal nos agentes da sociedade. Sobre isso:
“’Poneros’, em grego, significa ‘o mal’. O mal, porque o traço dominante no caráter dos novos dirigentes, que davam o modelo de conduta para o resto da sociedade, era inequivocamente a psicopatia. O psicopata não é um psicótico, um doente mental. Só lhe falta uma coisa: os sentimentos morais, especialmente a compaixão e a culpa. Não que ele desconheça esses sentimentos. Conhece-os perfeitamente, mas os vivencia de maneira puramente intelectual, como informações a ser usadas, sem participação pessoal e íntima. Quanto maior a sua frieza moral, maior a sua habilidade de manipular as emoções dos outros, usando-as para os seus próprios fins, que, nessas condições, só podem ser malignos e criminosos. Justamente porque não sentem compaixão nem culpa, os psicopatas sabem despertá-las nos outros como quem toca um piano e produz o acorde que lhe convém.
“Não é preciso nenhum estudo especial para saber que, invariavelmente, o discurso comunista, pró-comunista ou esquerdista é cem por cento baseado na exploração da compaixão e da culpa. Isso é da experiência comum.
“Mas o que o Dr. Lobaczewski e seus colaboradores descobriram foi muito além desse ponto. Eles descobriram, em primeiro lugar, que só uma classe de psicopatas tem a agressividade mental suficiente para se impor a toda uma sociedade por esses meios. Segundo: descobriram que, quando os psicopatas dominam, a insensitividade moral se espalha por toda a sociedade, roendo o tecido das relações humanas e fazendo da vida um inferno. Terceiro: descobriram que isso acontece não porque a psicopatia seja contagiosa, mas porque aquelas mentes menos ativas que, meio às tontas, vão se adaptando às novas regras e valores, se tornam presas de uma sintomatologia claramente histérica, ou histeriforme. O histérico não diz o que sente, mas passa a sentir aquilo que disse – e, na medida em que aquilo que disse é a cópia de fórmulas prontas espalhadas na atmosfera como gases onipresentes, qualquer empenho de chamá-lo de volta às suas percepções reais abala de tal modo a sua segurança psicológica emprestada, que acaba sendo recebido como uma ameaça, uma agressão, um insulto. É assim que um grupo relativamente pequeno de líderes psicopáticos destrói a alma de uma nação”.[5]
Calmon de Passos:
A razão ensina também que um dos efeitos mais decisivos da paixão é tornas os homens contrários uns aos outros, porque os objetos dos desejos são imaginados como posse ou propriedade de um só e cada um imagina que se fortalece se puder enfraquecer os outros e privá-los do que desejam.[6]
Na sábia lição do santo padre:
Todas as vezes que o homem deseja alguma coisa desordenadamente, torna-se logo inquieto. O soberbo e o avarento nunca sossegam; entretanto, o pobre e o humilde de espírito vivem em muita paz. O homem que não é perfeitamente mortificado facilmente é tentado e vencido, até em coisas pequenas e insignificantes. O homem espiritual, ainda um tanto carnal e propenso à sensualidade, só a muito custo poderá desprender-se de todos os desejos terrenos. Daí a sua frequente tristeza, quando deles se abstém, e fácil irritação, quando alguém o contraria.[7]
E ainda:
Se, porém, alcança o que desejava, sente logo o remorso da consciência, porque obedeceu à sua paixão, que nada vale para alcançar a paz que almejava. Em resistir, pois, às paixões, se acha a verdadeira paz do coração, e não em segui-las. Não há, portanto, paz no coração do homem carnal, nem no do homem entregue às coisas exteriores, mas somente no daquele que é fervoroso e espiritual.[8]
Ainda não há um consenso se os seres humanos respondem às condições ambientais ou se carregam na sua genética as bases do que será o seu comportamento ao longo de sua vida. No livro “Tábula rasa”, do psicólogo norte-americano Steven Pinker, discorre, com base numa série de estudos, que ambas as teorias têm sólidos argumentos, mas que não se excluem. Ou seja, é inconclusivo:
Às vezes as pessoas temem se os genes afetam a mente de alguma forma, devem determina-la em todos os detalhes. Isso é errado, por duas razoes. A primeira é que a maioria dos efeitos dos genes é probabilística. Se um gêmeo idêntico tem uma característica, geralmente não há mais do que a mesma probabilidade de que o outro a tenha, apesar de ambos possuírem um genoma completo em comum. Geneticistas comportamentais estimam que apenas cerca de metade da variação da maioria das características psicológicas em dado ambiente correlaciona-se com os genes. […] A segunda razão por que os genes não são tudo é que seus efeitos podem variar dependendo do ambiente.[9]
O problema em matéria de aceitar determinados comportamentos sociais é que os seres humanos possuem mecanismos na mente para copiar os atos de outras pessoas. Psicólogos sociais já documentaram de forma ampla que as pessoas sentem forte impulso de imitar comportamentos alheios. Um dos motivos apontados é que os seres humanos possuem um desejo de se beneficiar do conhecimento e do discernimento de outras pessoas. Isso pode ser facilmente analisado por aqueles que lembram que, muitos de seus comportamentos na infância, tinham como suporte o referencial de seus pais. Assim como uma série de atos inconsequentes na juventude correspondem ao comportamento do grupo de amigos com os quais se relacionava. Outro motivo é estar em conformidade com aquilo que é normativo (e isso não é sinônimo de lícito), que é o desejo de seguir as normas de uma comunidade, que corrobora, muitas vezes, com ações de vandalismo realizadas coletivamente, algumas como prova social perante aquelas pessoas.[10]
Sabe-se que muitas espécies possuem atos como estupros, mortes entre si, exclusão. Só que, inevitavelmente, não pode qualquer homem se comparar a um animal qualquer, destituído da capacidade de analisar os efeitos daqueles atos, raciocinar sobre o seu comportamento, que pode ser destituído do livre-arbítrio, tal como possuem os seres humanos. Ninguém pode sair mantendo relações sexuais com a própria mãe e justificar tal comportamento com base no comportamento de alguma espécie de chipanzé da natureza.[11]
Você até pode se condicionar a refutar o criacionismo ou qualquer defesa de valores cristãos. Não seria importante, no entanto, refletir, com os olhos voltados para a história, os efeitos de se pensar que o homem não passa de um acidente biológico?
É certo que o homem pós-moderno vive num cenário que está influenciado por uma série de mudanças culturais, embora se tenha analisado que nem sempre isso significará que tenham ocorrido melhorias para o seu bem-estar. Consome coisas que não precisa e se mantém num emprego que não gosta para dar vasão aos seus desejos e necessidades ilimitados. Mesmo que isso possa frustrar o projeto de vida de muitos, é possível que a maioria da população esteja vivendo sem perceber que vivem num estado de não-consciência e estupidez coletiva, num sonho constante em que há uma dificuldade imensa de acordar.
— O senhor acredita nisso? perguntou João Nogueira.
— Em quê?
— Eleições, deputados, senadores.
Retraí-me, indeciso, porque não tenho ideias seguras a respeito dessas coisas.
— A gente se acostuma com o que vê. E eu, desde que me entendo, vejo eleitores e urnas. Às vezes suprimem os eleitores e as urnas: bastam livros. Mas é bom um cidadão pensar que tem influência no governo, embora não tenha nenhuma. Lá na fazenda o trabalhador mais desgraçado está convencido de que, se deixar a peroba, o serviço emperra. Eu cultivo a ilusão. E todos se interessam.[12]
O historiador Loryel Rocha:
O Brasil foi adestrado como animal de circo pelos partidos políticos e o crime organizado. Ao longo de décadas, doses gradativas de crime e horror foram sendo aplicadas na mentalidade da sociedade de tal modo que perdeu-se por completo o senso das proporções, das quantidades e das qualidades. A letargia da sociedade diante dos monstruosos crimes diários noticiados é a prova cabal desse adestramento e da lesão cognitiva anatômica, corpórea, real. A sociedade brasileira está preparada para absorver as maiores atrocidades da elite brasileira SEM REAGIR, NEM PERCEBER. Aqui, quanto maior o crime mais “ESPERANÇA” o povo tem na justiça, e no “FUTURO”.
O “otimismo” brasileiro é uma patologia, resultado da engenharia social. O Brasil é, de fato, o pais do “FUTURO”. Foi projetado e adestrado para ser assim.
[1] COURTOIS, Sthéphane et al. O livro negro do comunismo. Tradução de Caio Meira, 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
[2] PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. p. 216.
[3] QUINTELA, Flavio. Apresentação da edição brasileira. In: LOBACZEWSKI, Andrew. Ponerologia: psicopatas no poder. Tradução de Adelice Godoy; Prefácio de Olavo de Carvalho. [S.l.]: Vide Editorial, 2014. Disponível em: <http://minhateca.com.br/Rita.Viviane/Livros+em+PDF/Ponerologia_+Psicopatas+no+Pode+-+Andrew+Lobaczewski,154690689.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2015. p. 8.
[4] SUPIOT, Alain. Homo juridicus: ensaio sobre a função antropológica do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 237. Para melhor compreensão do tema e abordagem, sugere-se a leitura dessa mesma obra, especificamente o capítulo 6 (Unir a humanidade: do uso correto dos direitos do Homem. SUPIOT, Alain. Homo juridicus: ensaio sobre a função antropológica do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 231-272).
[5] CARVALHO, Olavo de. Prefácio. In: LOBACZEWSKI, Andrew. Ponerologia: psicopatas no poder. Tradução de Adelice Godoy; Prefácio de Olavo de Carvalho. [S.l.]: Vide Editorial, 2014. Disponível em: <http://minhateca.com.br/Rita.Viviane/Livros+em+PDF/Ponerologia_+Psicopatas+no+Pode+-+Andrew+Lobaczewski,154690689.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2015. p. 7.
[6] PASSOS, José Joaquim Calmon de. Revisitando o direito, o poder, a justiça e o processo. Salvador: Juspodivm, 2012. p. 41. Que ainda afirma: “Se os homens só fossem conduzidos pela paixão, a convivência humana seria uma permanente luta de todos contra todos […]”.
[7] THOMAS, à Kempis. Imitação de Cristo: com reflexões e orações de São Francisco de Sales. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. p. 33-34
[8] THOMAS, à Kempis. Imitação de Cristo: com reflexões e orações de São Francisco de Sales. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. p. 34.
[9] PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. p. 77. E ainda: “Incontáveis estudos mostraram que a disposição para cometer atos antissociais, incluindo mentir, roubar, começar brigas e destruir propriedade, é parcialmente hereditária (embora como todas as características hereditárias esta seja exercida mais em certos ambientes do que em outros)”. PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. p. 80.
Corroborando com tal entendimento, conforme os estudos de Craig Venter: “Simplesmente não temos genes suficientes para que essa ideia do determinismo biológico seja correta. A prodigiosa diversidade da espécie humana não está instalada no nosso código genético. Nosso ambiente é fundamental”. Trata-se de uma declaração sua à imprensa, extraída de: PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. p. 114.
[10] Para maiores informações sobre o tema, consultar: PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. p. 96-99.
[11] Para maiores informações sobre o tema, consultar: PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2004. Não seria de todo ruim assistir ao Discovery Channel.
[12] RAMOS, Graciliano. São Bernardo. 82. ed. Rio de Janeiro: Record, 2005. p. 77.